23 de fev. de 2024

AULA DE PORTUGUÊS - TURMAS: 161 E 162 - ESCOLAS PRINCESA ISABEL E JOÃO DARCY - PROFESSOR ELEMAR GOMES

 

]O céu estava escurecendo rapidamente, fechado, com nuvens escuras, quase pretas, anunciando uma tempestade de trovões, relâmpagos e água pesada. Manezinho apressou o passo na estrada deserta meio sem saber o que fazer. Tinha pegado uma carona ate o trevo e agora caminhava em direção à cidade que se escondia do lado de lá da pequena montanha. Quase uma hora de caminhada e via apenas a estradinha se espichando, em direção ao monte de terra. Tomaria chuva, com certeza. No máximo, tentaria se esconder de baixo de uma daquelas arvorezinhas raquíticas que margeavam o caminho. A escuridão aumentou ainda mais, fazendo com que aquele homem danado de corajoso, tivesse medo do temporal e do aguaceiro que estavam para vir. Pensou em correr um pouco, mas desistiu, achando que nada adiantaria. Olhou para cima, como que buscando explicação, e resmungou: “Que venha água, que eu não tenho medo!”
Mal acabara de resmungar, avistou uma casinha branca e suja, na beira da estrada quase sem vegetação. Manezinho levou um susto que o fez arrepiar: até bem pouco tempo atrás, algumas dezenas de passos antes, a casinha não estava ali. Ou estava vendo uma miragem ou o medo da tempestade era real e não o estava deixando ver nada a sua frente. De qualquer forma, após a primeira impressão de estranhamento, apressou-se em bater à porta e pedir guarida, antes que a natureza o castigasse:
_Ò de casa!
Silêncio.
_Ó de casa! Tem gente ai?
Ouviu um ruído de ferro rangendo e a porta de madeira se abriu. Um rosto velho, cheio de rugas, mas simpático, apareceu com um sorriso acolhedor. Manezinho se explicou à velha senhora: _Vem chuva brava aí, minha senhora. Ainda estou longe da cidade… a velha olhava ternamente para Manezinho. _…se a senhora não se importar… _Claro que não, meu filho. Entre. A casa é pobre, mas dá para receber mais um. _Obrigado! Assim que a chuva passar, eu vou embora. _ Não precisa ter pressa. A casa é de pobre, mas cabe mais um. Entre.
Manezinho entrou. A casa era pobre mesmo. Na verdade, era estranha, mais estranha do que pobre: o cômodo em que se encontrava era grande, escuro, com luz de velas e três cadeiras apenas; havia um outro cômodo, mas estava fechado. Numa das cadeiras estava sentado o outro habitante da casa, um velho não menos simpático:
_Fique à vontade disse, levando para cumprimentá-lo com uma enorme mão fria sente-se. Manezinho sentou-se. os velhos também se sentaram. Pareciam tristes, mas queriam conversar.
_O senhor vem de longe? Manezinho contou alguns pedaços de sua história. _ Não tenho lugar de onde venho. Faz três ou quatro anos que não tenho lugar fixo. Sou do mundo… Andando aqui e ali… Para um pouco em cada lugar, trabalho, ganho algum dinheiro e torno a seguir caminho.
Um cheiro forte de velas tomava conta do cômodo e da história. _ Você não tem família? Manezinho não soube quem perguntou, se o velho ou a velha. Teve a impressão de que a voz não viera de nenhum dos dois. Que viera de algum outro lugar, tamanha era a quietude silenciosa do casal de velhos. _ Não tenho. Já tive um dia! Tive duas. _ Duas? _ É. Uma família onde eu nasci e outra que me criou desde pequeno. Depois que eu cresci e aprendi uma profissão, resolvi correr o mundo à procura de meus pais verdadeiros.
_ E ainda não encontrou seus pais verdadeiros?
Manezinho entendeu que a pergunta tinha vindo da velha senhora. A fraca luz das velas e o escuro do cômodo davam-lhe a impressão de que ela era transparente, algo nebuloso, sem consistência. Achou que fosse maluquice seu efeito do cansaço e medo da tempestade. Olhou mais fixamente para ela e respondeu:
_ Não. Acho que nem vou encontrar. Mas gostaria muito de encontrá-los e dizer que gosto muito deles, mesmo tendo sido criado por outras pessoas. Eu tenho uma fotografia deles me carregando no colo. Está muito gasta e estragada. Mas é a única pista que tenho para procurá-los. Quem sabe, um dia… _Nós também passamos boa parte da vida procurando o único filho que tivemos… Manezinho teve a impressão de que fora o velhinho o dono da fala. Continuou a conversa dirgindo-se a ele: _ _Procurando…? _ O destino tirou nosso filho. Eu não gostaria de morrer sem ver nosso filho. Um silencio mortal, regado a cheiro de vela, barulho de chuva, trovões e relâmpagos, interrompeu momentaneamente a conversa. _ Vou fazer uma sopa. O senhor aceita tomar um prato conosco? _ Aceito, claro. A velha senhora foi ao outro cômodo, que estava fechado, e no mesmo instante voltou com dois pratos de sopa. Ofereceu um ao velho e o outro a Manezinho. Voltou, buscou outro para si e veio sentar-se junto deles. _ É uma sopa pobre, mas é a mesma que ofereceríamos ao nosso filho se o encontrássemos. Manezinho tomou a sopa mais por gentileza. Não tinha gosto algum o liquido que ele levava a boca. Depois continuaram a conversa, devagar, com intervalos de silencio, mas sem parar. Havia nos velho algo de extremamente simpático e familiar, algo que, apesar das estranhezas da casa e do comportamento dele, cativava Manezinho.
_ Acho que seria a minha maior alegria reencontrar meus pais.
_ Também seria a nossa grande alegria rever o filho que o destino levou…
A conversa arrastou-se por mais tempo. Manezinho, às vezes, tinha a impressão de que conversava sozinho, tamanha era a quietude do casal de velhos. Foi assim até que sentiu sono. A tempestade tinha passado e ele decidiu que podia continuar a caminhada. Mas a gentileza dos velhinhos segurou-o mais tempo, dessa vez para dormir.
_ Não se vá. Está escuro e a cidade fica longe. Durma aqui e amanhã você seguirá caminho. Não tem cama, mas você pode se ajeitar num canto qualquer.
Ele agradeceu e aceitou. Encostou-se num canto do cômodo, esticou o corpo no chão frio, apoiou a cabeça na mala de lona que trazia consigo e dormiu. Dormiu cansado, ainda com fome, com frio e uma esquisita sensação de não estar entendendo direito sua presença naquela casa e a conversa com o casal de velhos. Dormiu mal, uma noite cheia de sonhos estranhos, pesados e incompreensíveis.
Acordou da noite mal dormida com a luz forte do sol filtrada pelo grosso vidro da porta da casa. Ainda cansado pela noite de sono ruim, correu lentamente os olhos pelos espaços da casa. Procurando primeiro a presença dos velhos e depois os objetos conhecidos. Não encontrou nem uma coisa nem outra. Não havia barulho de pessoas só silencio. Não havia sinais de vida. Só três cadeiras escuras encostadas à parede e quatro cavaletes de ferro cromado. Na frente dos cavaletes, como se fosse um altar, enormes castiçais com grandes velas brancas pareciam arrumados para alguma cerimônia. Ele deu um pulo, o coração batendo desesperado, quase à boca, e correu para a porta, abrindo-a imediatamente.
Não fosse Manezinho quem era uma pessoa acostumada às surpresas, as mudanças, aos reveses da vida, teriam sucumbido ante o susto que levou quando percebeu onde estava: acabara de passar a noite na capela do cemitério da cidade. Saiu disparado em direção ao portão. No caminho encontrou uma pessoa, provavelmente o coveiro, cavando duas covas. Parou afobado junto ao homem e perguntou-lhe:
_ O senhor pode me dizer se há por aqui uma pequena casa habitada por um simpático casal de velhos?
O coveiro ergueu o corpo, descansou a pá suja de terra e respondeu:
_ Não moço. No caminho da cidade só tem mesmo o cemitério. Agora…o casal de velhos simpáticos de que o senhor está falando pode ser o que morreu esta noite. São dois velhos que moram perto da escola. Eles morreram, depois da chuvarada. Essas covas são para eles…
Um arrepio profundo quase revirou o corpo de Manezinho. Lembrou-se da conversa, do cheiro de vela…
_ Onde o senhor disse que eles moram?
_ Moravam, moço. Agora já morreram.
_ Perto da escola. Todo mundo sabe, é só perguntar.
Manezinho disparou pela estrada. Estava um pouco longe, mas a carreira foi tão aflita e desesperada que num instante a cidade chegou perto dele. Mais um instante e descobriu a casa do casal de velhos. Sentiu que estava perto, bem perto de alguma explicação. O cheiro de velas da noite anterior voltou aos seus sentidos quando entrou na pequena sala onde estavam, lado a lado, os dois caixões de madeira com os corpos. Aproximou-se, devagar, e viu os rostos do simpático casal com quem passara a noite anterior. O estÔmago vazio resmungou em coro com o coração acelerado. Ali estavam seus dois companheiros de conversa! Mas faltava alguma coisa ainda. Faltava uma explicação. Por que ele? Por que ele? Por mais que procurasse entender o episodio da noite passada no cemitério, não conseguia encontrar explicações.
Ficou muito tempo de pé, parado em frente aos corpos em meio à curiosidade das pessoas que ali estavam. Alguém lembrou-se de convidá-lo a sentar-se. Manezinho agradeceu e sentou-se. Os olhos começaram a correr a parede, mecanicamente, procurando aqui e ali os detalhes que estavam escapando de sua compreensão. E foi assim, nessa procura, recolhendo pedaços de lembrança, que reparou em uma moldura desbotada presa a parede.
“Não é possível! Não é possível”
Apanhou sua carteira e, atrapalhado, remexendo papeis e cédulas velhas de dinheiro, pegou uma pequena fotografia. Nela, um casal abraçava carinhosamente uma criança de cerca de três anos, era a foto dele com seus pais verdadeiros, primeira e única foto, relíquia guardada por anos e anos.
Manezinho levantou-se, trêmulo, e se aproximou da foto maior da parede. Somente a mesma foto.
A cidade toda ouviu o grito de Manezinho.
Edson Gabriel GarciaSete Gritos de Terror. São Paulo, Moderna, 1991.


UM CASAL DE VELHOS - ATIVIDADES

1) Enumere as frases de acordo com a ordem do texto:

(   ) "Manezinho sentou-se. Os velhos também se sentaram. Pareciam tristes, mas queriam conversa."

(   ) " Mal acabara de resmungar, avistou uma casinha branca e suja, na beira da estrada quase sem vegetação."

(   ) " Acho que seria minha maior alegria reencontrar meus pais."

(   ) " A cidade toda ouviu o grito de Manezinho."

(   ) " Um cheiro de velas tomava conta do cômodo e da história."

(   ) " Um silêncio mortal, regado a cheiro de vela, barulho de chuvas, trovões e relâmpagos, interrompeu momentaneamente a conversa."

(   ) " moravam, moço agora já morreram."

2) Por que Manezinho procurou abrigo na casa do casal de velho?

 

3) Como Manezinho foi recebido pelo casal de velhos?

 

4) O que significava o cheiro de velas?

 

 

a)

 

 

 

 

 

 

R

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

b)

 

 

 

E

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

c)

 

 

L

 

 

 

 

 

 

 

 

 d)

 

 

 

 

 

 

A

 

 

 

 

 

 

 

 

 

e)

 

 

 

 

 

M

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

f)

 

 

 

 

P

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

g)

 

A

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

h)

G

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

i)

 

 

 

 

O

 

 

 

 

 

 

 

 

 

j)

 

 

 

 

 

S

 

 

 

 

 

 

 

 

5) Cruzadinha:

a) O lar eterno dos mortos.

b) Quem faz a cova é o...

c) O que reveste quadros e porta- retratos?

d) Retrato também é conhecido como...

e) O velho morre. Os velhos...                      

f) Sinônimo de calafrio.

g) Manezinho teve uma noite...

h) O que fez Manezinho ao constatar a verdade, no final do texto?

i) Assustou-se, levou um...

j) Chuva forte também é conhecida como...

 



 

6) Procure no caça-palavras, algumas palavras presentes no texto que remetem ao tema mistério:

V

E

N

T

O

T

X

C

M

T

E

M

P

O

R

A

L

O

R

Q

N

R

Z

O

C

N

R

A

N

T

T

R

V

F

Ç

T

I

E

A

X

O

Õ

B

M

E

R

E

L

Â

M

P/E

A

G

O

C

H

U

V

A

S

Q

Z

J

7) Responda:

Onde a história acontece?

Ilustre e descreva os ambientes:

 

 

8) Em sua opinião, Manezinho conheceu seus pais biológicos? Ou apenas seus “fantasmas”? Justifique:

 

 

9) Qual é a importância do coveiro na narrativa?

 

10) O que nos sugere o nome do personagem " Manezinho"?

 

 



 

PRODUÇÃO DE CONTO DE TERROR

 

Agora é a sua vez. “Bora” escrever? Imagine se você estivesse na situação do Manezinho!  Qual seria a sua reação? O que faria ao descobrir que tinha passado a noite com dois mortos! Seja criativo! Não esqueça do título, do começo, meio e fim.

 

TÍTULO

 

 

INTRODUÇÃO

            

 

 

 

 

 

 

 

DESENVOL-

VIMENTO

            

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONCLUSÃO