10 de mar. de 2013

AULA DE TERÇA-FEIRA- 12/03/2013


 
A Moça Tecelã
AUTORA: Marina Colasanti

 

Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear. Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.

Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.

Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.

Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.

Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.

Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.

Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.

Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.

E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.

— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.

Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.

— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.

Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.

 

Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.

— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!

Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.

Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.

Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.

A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.

 

Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.

 

COM BASE NO TEXTO, RESPONDA:

 

1) Nos primeiros parágrafos, a autora constrói uma relação curiosa entre as cores que a tecelã usa e aspectos do dia e do clima. Cite no mínimo três e explique o por que destas relações:

 

2) De que forma a moça tecelã passava seus dias?

 

3) O texto emprega uma linguagem conotativa, ou seja, os termos são empregados de forma figurada, não no seu sentido real. Para compreender a mensagem que o texto pretende passar é preciso lê-lo com muita atenção. Explique, com suas palavras o que você entende a partir do trecho “ Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.”

 

4) Por que a mulher “desteceu” o marido e a vida que criara com ele? O que, em sua opinião, a fez tomar esta decisão? O que lhe faltava?

 

5) O que se pode compreender com a frase “e novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela”?

 

6) Se você pudesse “tecer” sua vida, como ela seria?

 

7) Separe as palavras que você não entendeu e dê os seus significados.

 

ATIVIDADES GRAMATICAIS

1) RETIRE DO TEXTO:

a) Dois trechos de discurso direto:

 

b) 4 trechos de discurso indireto:

 

2) RESPONDA:

a) Que tipo de narrador o texto apresenta? Por quê?

b) O que predomina no texto: a narração em 1ª pessoa ou a narração em 3ª pessoa?

 

3) MARQUE V OU F:

( ) O texto é narrado no presente.

( ) A narradora do texto é Marina Colassanti.

( ) A moça tecelã é a autora do texto.

( ) As falas do marido, no texto, são exemplos de discurso direto.

( ) O texto é narrado por um narrador-observador, ou narrador-onisciente.

 

4) PASSE O TRECHO A SEGUIR PARA O DISCURSO DIRETO:

a) O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

________________________________________________________________________________

 

5) INDIQUE OS DÍGRAFOS EXISTENTES NAS SEGUINTES PALAVRAS:

a) ambos: ______________ b) aquático: _____________

c) arremessar: ___________ d) desçamos: ____________

e) descida: ______________ f) discente: ______________

g) descoberto: ___________ h) escravo: ______________

i) guerrilha: _____________ j) prosseguir: ____________

 

6) INDIQUE O NÚMERO DE LETRAS E FONEMAS DAS SEGUINTES PALAVRAS?

a) aguado: _________

b) floresçam: ________________________

c) assessorasse: _________________

d) homicida: _________________________

e) casca: _______________________

f) oblíquo: ___________________________

g) descoberto: ___________________

h) também: __________________________

i) escrivães: ____________________

j) aquele: ____________________________

k) excluir: ______________________

l) bochecha: ________________________

 

FAÇA UM DESENHO SOBRE UM OBJETO QUE LHE CHAMOU A ATENÇÃO NO TEXTO.